Deixem-me roubar um bocado da minha costela publicitária para analisar dois slogans políticos que ficaram na cabeça dos moçambicanos nos últimos quase 6 anos. O primeiro seria "combater a pobreza absoluta" e o segundo "geração da viragem".
O "combater a pobreza absoluta" é formado por duas palavras bastante conhecidas pelos moçambicanos (público alvo), "combater" (da história da luta armada) e "pobreza" (algo que se vive ou se tem medo de viver num país do 3º mundo), o comando que resulta da combinação dessas duas palavras produz dois sentimentos: vontade lógica de afastar-se dum estado negativo, o de ser pobre, e uma dúvida ou interrogação sobre o que fazer para obedecer esse comando. De seguida temos uma palavra que parece insignificante, mas que é extremamente importante pela discórdia que provoca,"absoluta". Acredito que o único momento que usamos essa palavra é quando desejamos classificar a nossa certeza, "certeza absoluta"(pérola interessante da tautologia). Então que raio está essa palavra, tão pouco usada, a fazer no slogan dum governo? A resposta é lógica: novidade.
A novidade é algo a qual nunca ficamos indiferentes, ou gostamos ou desgostamos, mas sempre nos manifestamos. Que há pobreza, sabemos. Que é absoluta? É algo para se discutir. E é o que aconteceu no nosso país.
Então tínhamos inicialmente dois debates. Primeiro: como combater a pobreza? Segundo: o que significa a pobreza ser absoluta? Bem, muita água correu debaixo dessa ponte. Relatórios internacionais, definições sociológicas, análises de especialistas políticos, discursos do governo, respostas da oposição, temas para músicas e para piadas por sms. Mas uma coisa é certa. O slogan resultou. Está na cabeça das pessoas, e hoje começa a produzir sub-slogans: "pobreza urbana". Outra coisa abstracta, discutível. Outra ponte para mais água passar. E deste modo, muito e pouco se faz debaixo desse conceito propagandístico. Conferências, planos quinquenais, e até justifica-se o enriquecimento (lícito ou não), a abertura do país para investimentos turísticos, bancários e minéiros, negligenciando a produção, tudo em nome de um slogan político. Afinal, enriquecer é combater a pobreza absolutamente.
O segundo slogan político é "geração da viragem". E mais uma vez encontramos os elementos anteriores: identificação histórica e novidade. E mais um elemento novo: um público alvo mais específico, mas que tornou-se centro das atenções nos últimos tempos: juventude.
Comecemos pela "identificação histórica", e depois a "novidade". A palavra "geração" é do domínio de todos os moçambicanos. Já tivemos a "geração da independência" e a "geração 8 de Março". A palavra "geração" provoca um sentimento de unidade e identificação mútua. E houve consenso em relação a forma como foi aproveitada. A palavra "viragem" é o elemento novidade. É outra palavra que raramente usamos, a não ser nos brasileirismos: te vira, virou o quê? Mas aí é que entra a questão chave. Vamos recuperar a palavra "geração" e perceber porque ela foi "acordada" e como é que ela se relaciona com a "viragem".
Num contexto político em que acabava de surgir uma terceira força política que tinha como alvo a juventude e que a mesma é a maioria dos votantes, seria estupidez se os concorrentes não dessem a devida atenção a isso. Para não alongar questões políticas, diria que a juventude representava e representa o centro do tabuleiro deste jogo político que será ganho por quem souber ocupá-lo e explorá-lo.
A geração representa a juventude. A "viragem", repare-se que é um termo jovem, quando combinada com a "geração" produz um comando que imprime uma hipotética dinâmica entre os jovens. "Pelos menos o governo está a olhar para a juventude", "a juventude já não é marginalizada", "temos jovens em posições de topo no governo", isto é o resultado que o slogan e algumas acções provocam no público-alvo.
Mas, mais uma vez, temos igualmente a pergunta: o que deverá fazer a geração da viragem? Motor de discussões televisivas, questão disputada pelos média com se de um osso saboroso se tratasse. Mas o que interessa aqui, mais uma vez, a nível de marketing político, não é fazer sentido ou ser consensual. É ter impacto. E resultou. Viveremos nos próximos tempos debaixo desse slogan. Ele justificará muita coisa. Será mais uma ponte para mais água passar.
Aos pensadores por detrás destes slogans políticos, um "parabéns maquiavélico".
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